quarta-feira, 10 de setembro de 2014

palavra sem dor
rima com cor
de aurora brotando
na manhã tão fria.
as luzes da cidade
amanhecendo a noite
e os seus braços quentes
cálidas conjunturas
( meu coração palpável)
sonhando suas branduras


contas de guias
caiadas
num céu de cobre.
embaixo a cidade
nunca dormia
sobre seu manto cinza
que em camadas escondia
a nudez dos dias
esquecidos.
por vezes cochilava
e seu próprio ronco
acordando asas de homens
que não sonhavam.
no largo do paço
entre avenida e outra
como um ponto insistente
movente e louca
se derramando em
asfalto, semi-deserta
de homens que outrora
descobriam a mesma
eletricidade.
cidade vadia
mina de luz no breu.
dona sem dono
nem você nem ninguém
nem eu.

poeminha

sua geografia
partida
repetidas vezes
na memória
liberta o que se inicia
pra compor uma nova história.


as minhas parabólicas são apenas do meu olhar
tudo que vejo não é meu
apenas meus olhos podem tocar.
cidade- minha
não- minha
minha menos minha,
é de todos todas as luzes.
a favela se ergue
acima dos prédios escuros,
versos livres
coração preso
hoje tô tão blue
abandonado
não tenho dono nem preço
nem peço.
solitário
escrevendo sob a luz do prédio ao lado.
não consigo dormir
o vazio pesa tanto
e o um é tão pouco.
Mas minhas parabólicas não me abandonam
miram algum satélite
achado localizado no espaço,
vínculo invisível.
elas me olham mesmo de costas pra mim.
mais uma luz se apagou
no prédio em frente
não me imaginam
e o poeta adormeceu.
meu Deus! quantos eus!
e nem sabem de mim.
não tenho plano de saúde
nem carro nem tv nem dvd
nem um salário que preste
meus amores estão longe daqui
o que faço eu
procurando agulha no palheiro?
sem dinheiro
sem alguém
to igual ao cara de rua, abandonado.
um calor, um lençol
um cobertor 
de uma noite só.
tudo tá distante
nada como antes
nada como depois
só hoje existe
e super frágil
em meio dessa cidade cinza azul vermelha,
toda minha infância retorna
em cheiros- imagens
isso é bom ou ruim?
ela não liga pra mim.
só o cristo
imóvel na janela mutante
voando como num abraço distante.
quantos amores pra trás?
clandestino no meu próprio país.
olhando a cidade que dorme
com certeza? alguém pensa em mim
nesse exato momento
remédio
pro mal que não tenho.
consegui uma senha e um emprego
de barman na lanchonete.
quantos olhos vazios!
de longe toca um blues
eu posso ouvir
parece vir
da luz daquele poste e dos milhões de fios nele.
a fumaça invade e não vale o que ela é!
minha janela tá aberta pro mundo
só que o mundo não entra no meu quarto
no meu quarto,
um quarto de mim.
o resto espalhado por aí.
se fosse só a outra metade do outro lado da cidade...
mas nem isso.
hoje, no meu quarto,
durmo com o meu quarto,
com meu 1/4
do qual não posso fugir
eu grito
e todo mundo me ouve
abrem as janelas
quem é esse louco gritando por amor as quatro da manhã?
e quanto a outra metade?
quem vai conseguir dormir?
olho pros olhos da noite
brilhando com mercúrio nos olhos
imagino uma chuva de sonhos
e sonhos chovendo de amores.
agora dores indolores
cheiros inodoros
labirinto de cimento
tudo nesse momento.
o mundo é vasto
e a vida um fio
caudaloso rio só no interior
no interior do abrigo dos teus olhos
teus olhos de antes.
hoje: eu:
com partimento secreto.
meu avesso: de passados repleto.


rio, abril de 2007